As manifestações culturais em Mauriti tiveram seu apogeu nas décadas de cinquenta/sessenta/setenta: a dança do coco, o reisado e as badas acabaçais. Vamos iniciar falando sobre a dança do coco: “É canto-dança típico das regiões do Agreste e Sertão e nas antigas áreas de cana-de-açúcar, dança popular nordestina. Possivelmente, durante o século XVI, o coco começou a se estruturar, oriundo das danças de umbigadas dos batuques africanos”.
Entre as diversas manifestações culturais que povoam o Ceará, a dança do coco está presente como prática popular do litoral ao sertão. É um manifestação folclórica que tem início como conceito em 1846, pelo arqueólogo e pesquisador inglês William John Thoms (1803-1885), para designar um campo de estudos até então apontados como “antiguidades populares” ou “sabedoria do povo”. Ao longo do tempo vem assumindo outras interpretações e concepção, sobretudo com Mário de Andrade e Renato Almeida, que associa a expressão folclore aos estudos de Etnologia e Antropologia cultural, acrescentando a análise de outros aspectos da vida social e material, como danças e culinária, por exemplo.
As vestimentas na dança do coco, tradicionalmente, são “chita, com chapéu de palha. Usa-se também o machadinho e o cofo como adereços”, destaca Osório Neto. “A dança do coco apresenta uma coreografia básica: os participantes formam filas ou rodas onde executam o sapateado característico. Com influências africana e indígena, é uma dança de roda acompanhada de cantoria e executada em pares, fileiras ou círculos durante festas populares do litoral e do sertão nordestino. … Cada grupo recria a dança e a transforma ao gosto da população local. O som característico do coco vem de quatro instrumentos (ganzá, surdo, pandeiro e triângulo), mas o que marca mesmo a cadência desse ritmo é o repicar acelerado dos tamancos”. A sonoridade é completada com as palmas. Danças folclóricas são formas tradicionais de danças recreativas do povo. As danças sempre foram um importante componente cultural da humanidade e tem origens anônimas, passadas de geração para geração durante um longo período de tempo. Como contava minha avó, que a avó dela resmungava baixinho uma cantiga e dizia para as netas que veio da África: “Avun-cê, nabúbú, Avun-cê, nôgõ ein, Avun-cê, nobúbú”; resquícios de uma cultura que se dilui em grande parte dentro da cultura dos brancos.
Na praia de Majorlândia, município de Aracati, ainda se pode presenciar exibições de dança do Coco, também denominada de pagode, zambé, bambelô. É apresentado ao som de caixas, pandeiros, ganzás, íngonos, numa batida contagiante. Homens e mulheres reúnem-se em roda, com um solista no centro, fazendo passos ritmados, “puxando o coco”, e ao cumprimentar e a despedir-se dos parceiros com umbigadas, fazendo vênia ou com batida do pé. E a entoarem quadras, emboladas, sextilhas e décimas, puxadas pelo refrão. Um bailado indígena, dos tupis do litoral.
Em Mauriti a Dança do Coco tem seu lócus de realização no bairro Serrinha, imigrantes que vinham fugindo das lutas de Princesa, na Paraíba, ou abandonavam regiões inóspitas em Pernambuco, aportaram em Mauriti. Acolhidos com emprego nas usinas de beneficiamento de algodão, nos engenhos de rapadura e no cultivo do milho e algodão, adotaram as terras mauritienses como seu novo berço, formaram famílias e construíram patrimônio. Entre as famílias originárias que habitaram a Serrinha, primeiro em casas de taipa, com o tempo casas de alvenaria: Félix, Bonito, Braz, Lalau, Borges e Isidro, entre outros. São as lideranças dessas famílias e seus filhos que impulsionam a Dança do Coco, lhe dá visibilidade e ao longo dos anos sustentam essa riqueza cultural e histórica: cultural porque disseminam traços culturais de um povo, como cantigas, instrumentos musicais e danças de origem africanas; histórica, pois consubstancia a chegada de nova gente no município de Mauriti, nos legando costumes e nos transmitindo sua história. Tudo isso se constitui em aprendizado, em novas sociabilidades, em nova visão de mundo.
