MAURITI, MULHERES QUE FIZERAM HISTÓRIA, LAURA DIAS CAVALCANTE PROFESSORA DO BURITIZINHO

PROFESSORA LAURA DIAS CAVALCANTE (1916 – 1993)

Laura Dias Cavalcante, nasceu em 28 de novembro de 1916, no povoado de São José de Piranhas, à época distrito do município paraibano de Cajazeiras; o município de São José de Piranhas é cortado pelo rio intermitente Piranhas, que deu o nome ao município. Dona Laura, como era conhecida, residiu em São José de Piranhas até a idade de 12 anos, em 1928, quando migrou com a família para o Ceará. Os familiares de dona Laura fugiam do teatro das disputas, enfrentamento de cangaceiros, coronéis e a força policial; no Nordeste a geografia política se definia a partir das relações de poder que ocorria entre cidades e regiões: Sertão Paraibano, Borborema, Agreste e Mata Paraibana. Na mesorregião dos Sertões Paraibano, concentravam-se cidades polos como Patos, Sousa, Cajazeiras, São Bento, Catolé do Rocha, Itaporanga e Princesa Isabel; nas primeiras décadas do século XX se espalhavam por essas cidades coronéis, capangas, cangaceiros e as volantes da força pública estadual. A geopolítica se dava pela troca de favores entre coronéis ou pela hostilidade entre esses poderosos o que, indiscutivelmente, atingia famílias mais vulneráveis que habitavam a região. Foi o que aconteceu com a família de dona Laura Dias Cavalcante, que habitava uma área onde o terror dos cangaceiros e a opressão dos coronéis fizeram com que migrasse. Em Piranhas tem origem corneis sanguinários como Antônio Alves de Figueiredo, bandoleiros e salteadores que funcionavam a serviço desse coronel, João Pires e Torquato; em cidades mais afastadas de São José de Piranhas estão Bonito de Santa Fé, comandada pelo Capitão Temotheo e descendentes; no Sertão de Cajazeiras, Coronel Zuza das Bruscas (Zuza Lacerda) criador da República da Estrela, hoje Município de Boa Ventura, controlava com mão firme seu município e espraiava sua fama em toda a região; em Princesa Isabel reinava absoluto o Coronel Zé Pereira e seus apaniguados. Esses miqueletes amedrontavam comerciantes, famílias e ameaçavam todo aquele que não “lesse em sua cartilha”. Portanto, para fugir desse ambiente hostil e opressor a família Dias migra para o Ceará, na perspectiva de estar próxima ao Padre Cícero; era gente que cultivava a paz e a harmonia social, por coincidência aporta no então povoado de São Francisco, hoje distrito de Buritizinho, onde encontrou, basicamente, uma só família, pois o imbricamento entre parentes serviu para reproduzir uma vida social harmoniosa e fraterna.

A jovem Laura Dias e seus familiares foram logo adotados pela benquerença da sociedade de São Francisco (Buritizinho), com o tempo tornou-se esposa do sr. Abrão Alencar, tiveram 16 filhos em uma convivência profícuo e harmônica, que durou 52 anos.

Dona Laura Dias Cavalcante era uma mulher além de seu tempo, no povoado, hoje Distrito de Buritizinho, conheceu o vigário de Mauriti, Padre Macedo, que celebrava as missas na Capela de São Francisco. Ao se dispor a ajudar o padre durante os atos religiosos, logo foi reconhecida pelo sacerdote como uma pessoa que poderia contribuir com a melhoria daquela comunidade pacata e ordeira. Ao reconhecer sua boa caligrafia, o Padre Macêdo convidou-a para dar aulas na casa paroquial, já que a localidade não possuía escola. Ao enfrentar esse novo desafio, dona Laura pôde perceber mais de perto as necessidades dos moradores, as dificuldades para a educação das crianças, enfim o ciclo de pobreza que envolvia aquela gente. Com o passar do tempo, Padre Macedo, um grande visionário, identificou habilidades pedagógicas, voltadas para a alfabetização, excelente caligrafia, a empatia em relação as crianças, fez com que a indicasse para ser nomeada professora do município. Como professora, pelo seu bom desempenho, capacidade de trabalho e doação a comunidade é logo incorporada a cátedra municipal. Como era uma mulher proativa, dona Laura percebeu a necessidade de se qualificar, assim fez alguns cursos de capacitação e treinamento o que implicou em melhorias em suas atividades docentes.

Dona Laura, sempre se posicionou acima das querelas político partidárias, mantendo suas preocupações voltadas para a política educacional, novos conhecimentos e tudo o mais que acontecia de melhorias no mundo da escola. Seu ingresso no corpo docente do município de Mauriti ocorreu em momentos políticos de grandes tensões: o ocaso do Estado Novo (1945-1946) com a deposição de Getúlio Vargas e a realização de eleições democráticas com a vitória do Marechal Dutra. No Ceará o poder, ainda, continuou nas mãos do PSD de Meneses Pimentel; em Mauriti encerrava a interventoria com a gestão de José Leite da Costa, PSD 1945-1946.

Seu espírito de lutadora pela causa social, a tornou conhecida pelas gestões municipal, legitimando-a como interlocutora junto aos diferentes prefeitos de Mauriti; trabalhou para que o poder público municipal construísse uma escola no pequeno povoado. Enquanto não alcançava seu intento, dona Laura ministrava suas aulas em prédio da casa paroquial: pela manhã aula para as crianças, à noite dava aulas para adultos, até o município se dignar a construir a sonhada escola. 

Seu bom relacionamento com as autoridades municipais, relacionamento esse fundado no bom exemplo e na dedicação aos seus alunos, sempre conseguia que suas demandas fossem atendidas: merenda escolar, materiais didáticos, até mesmo ajuda para as famílias carentes da localidade. Quando não conseguia ser atendida pelo poder pública, comprava materiais com o seu próprio dinheiro, para suprir as necessidades da escola e dos alunos. Muitas vezes praticava a operação socializar, isto é, dividia um lápis ao meio para dois alunos, devido a carência e a escassez de recursos naquela época. Com isso não decepcionava as crianças, ao tempo em que manifestava o respeito a individualidade de seus alunos.

Dona Laura amava o que fazia, as dificuldades e a pobreza daquela gente não a desanimava, de maneira que quando algumas portas se fechavam para suas demandas, ela recorria à ajuda do esposo, Abrão Alencar e da família que a apoiavam, eram animadores de seu trabalho.

Como professora municipal não recebia salário como deveria, pois recebia apenas uma ajuda de custo da Igreja para lecionar, tanto que não se aposentou. Como gratidão, muitos alunos a presenteavam com bacias cheias de cereais ou frutas como: feijão verde, cajus, mangas, banana e outras frutas típicas da região, isso em época de bom inverno. 

Dona Laura, como era conhecida, amava muito a sua profissão e tudo o que fazia era com muito amor e dedicação. O seu bom relacionamento com todos da comunidade consagrava a como uma líder, quando necessário recorria ao prefeito de Mauriti pedindo ajuda para as pessoas mais carentes e para a escola, era sempre atendida. Presidente do clube 4 S que envolvia produtores rurais e suas famílias, fazia a interlocução com equipes da Ancar Ceará, os técnicos vinham do Crato fazer treinamento com as pessoas da comunidade, ensinavam a fazer hortas, a cultivar e preparar verduras, legumes e frutas, o que contribuía muito para que a população tivesse uma melhor alimentação. Inovava no relacionamento com os alunos, através das práticas agrícolas e interagia com a comunidade somando forças para solucionar problemas, encaminhar demandas, sem jamais perder o entusiasmo.

Funções que ocupou

Primeira professora de Buritizinho, lecionou por 40 anos na Escola Rural Isolada de Buritizinho. 

 Administrava a biblioteca. 

 Coordenava atividades da igreja.

 Mantinha o controle do cemitério, acompanhava os enterros, o que a credenciava a emitir certidão de óbito. 

 Costurava os uniformes para os alunos participarem do Desfile Cívico de Sete de Setembro e confeccionava até a Bandeira Nacional para o evento.

Organizava o Desfile e todos participavam com muito orgulho e prazer. Nesse dia todos tinham que saber o Hino Nacional e o Hino da Bandeira, que eram cantados pelos alunos.

O Dia da Pátria, como ela chamava “Sete de Setembro” era um dia inesquecível porque o encerramento se dava com um Pic-Nic e, em seguida, um Baile, organizado por Dona Laura e, isso incentivava todos a participarem do Desfile Cívico de Sete de Setembro.   

Preparava as crianças, na Igreja, dando catequese, para fazerem a Primeira Comunhão.

 Era presidente do clube 4 S.

Organizava leilões da Igreja no intuito de angariar fundos para ajudar a instituição.

Todos os anos, no Dia Quatro de Outubro, realizava, junto da Igreja e com a ajuda da comunidade, a tão conhecida Festa de São Francisco. 

Era uma grande colaboradora da Igreja, inclusive, ajudou na reforma da Matriz de Mauriti, com ações como: decidir o tamanho, a estrutura, dentre outras. 

Dona Laura era uma mulher incrível, uma esposa e mãe excelente, para comunidade uma líder que  conseguia fazer o inimaginável 

Alfabetizou inúmeras pessoas do Buritizinho, do Alto Vermelho, do Caldeirão e das localidades vizinhas. 

Deixou um legado de grande valor!

Começou a lecionar em 17 de fevereiro de 1945, data da sua primeira aula em Buritizinho, encerrando essas atividades no ano de 1968.

Dona Laura é a síntese da sabedoria que emerge da alma, como explica um provérbio chinês: “Se você está planejando para um ano, semeie arroz; Se você está planejando para uma década, plante árvores; Se você está planejando para toda a vida, eduque as pessoas”.  Em sua sala de aula no buritizinho planejou para a vida toda.

RANCISCO CARTAXO MELO
Professor da UECE aposentado
Economista/Analista de
Planejamento Seplag/Iplance
aposentado
Consultor organizacional FLACSO
(Faculdade Latino Americana de
Ciências Sociais)

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